O BURRO

Há uns tempos encomendaram-me um bolo com as seguintes especificações: simples, mas sofisticado, minimalista e com linhas direitas, e um burro no meio.
Levei algum tempo a conciliar os conceitos.
Encaixar num mesmo bolo um animal que por definição é rústico, com um ambiente sofisticado, era o que de mais complicado se me afigurava...
Lá fiz, fizemos, e lá foi entregue. Gostaram muito e correu tudo bem.
Não pensei muito mais no assunto... gostei do resultado final, quem encomendou ficou contente, assunto encerrado.
Ontem, um amigo contou-me que tinha andado de burro.
Contou-me que foi uma grande lição de humildade que lhe foi concedida.
Bebi cada palavra do relato, e maravilhei-me com a simplicidade do raciocínio, e com o brilho dos olhos que me transmitiam aquela aprendizagem.
Sem o ter avisado, conto-vos, sem grandes preocupações de fidelidade às palavras dele, porque estas são as minhas, o que aprendi.

O burro é um animal que à partida não nos angaria os melhores dos sentimentos: sabemos perfeitamente a conotação que tem chamar burro a alguém... não é particularmente bonito, por isso são raras as crianças que o querem para animal de estimação ou o sucedâneo de peluche, não tem a elegância do cavalo, nem tão pouco a velocidade e brilhantismo dos garanhões.

Ainda assim, e depois de nos despirmos dos preconceitos, tem aquilo a que podemos chamar a melhor parte:
o burro gosta de servir o próximo, é assim que se sente bem
o burro sabe sempre o caminho de volta a casa.
o burro parecendo frágil, persiste com solidez, em cada passo.
o burro não tem pressa, mas chega ao destino a tempo e horas.
o burro não é bonito, mas é meigo, irradia ternura e preocupação com o seu dono.
o burro não se envergonha de si próprio, tem confiança.
o burro não procura o caminho mais rápido, antes o mais equilibrado e o que lhe é possível.

Do burro, parece-me que tenho ainda muito que aprender.

Não está o discípulo acima do mestre, mas o discípulo bem formado será como o mestre. Lc 6, 40